Paulo Mazzafera perfurando um disco do tamanho de ervilha em uma folha de café verde cerosa, em seguida, colocando o disco em um pequeno frasco com uma mistura de clorofórmio e metanol para o dissolver. Mais tarde, carregando o extracto, juntamente com outras 95 amostras, em uma máquina de cromatografia líquida, a qual separa cada componente químico. Quando o fisiologista vegetal voltou ao seu laboratório na Universidade de Campinas no Brasil na manhã seguinte, ele se sentou em seu laptop para examinar os resultados. Rolagem de um cromatograma para o outro, ele percebeu que o pico representando cafeína, em uma planta, estava faltando. Mazzafera correu a amostra mais duas vezes e, em seguida, pouco antes do meio-dia, chamou o sau colaboradora Bernadete Silvarolla, com base na estação agrícola próxima, para compartilhar a notícia. "Você tem certeza?", Perguntou ela. Na verdade, ele ficou entusiasmado. Após uma análise de milhares de plantas ao longo de duas décadas, seu projeto de encontrar um café naturalmente sem cafeína finalmente parecia estar a dar frutos. Isso foi no final de 2003. Em 2004, veio a surpresa. A descoberta ganhou visão internacional com a publicação, no mesmo ano, de um artigo na revista científica "Nature", uma das mais renomadas do mundo. Desde então, o desafio tem sido tornar esses grãos naturalmente descafeinados comercialmente viáveis. O obstáculo ainda é elevar a sua produtividade. Enquanto uma boa média é de 20 a 30 sacas de café colhido por hectare, a variedade "AC" rende, no máximo, 10 sacas. "É isso o que eu estou tentando corrigir. Temos que quebrar bloqueios biológicos", diz a pesquisadora. O trabalho de melhoramento genético convencional, no entanto, é vagaroso. Os cruzamentos são realizados à mão e transferem os genes do grão naturalmente descafeinado para sementes de uma cultivar modelo de café arábica. Uma vez que a muda de café é plantada, só vai gerar seus primeiros grãos depois de um prazo de quatro anos. O IAC obteve recentemente a segunda geração de plantas obtidas desses cruzamentos e os resultados foram satisfatórios, mas diz que só poderá comprovar que chegou à produtividade desejada depois de quatro colheitas. "Precisamos encontrar características boas de dois ancestrais diferentes. Antes de 2020 não teremos nada a mostrar". Para a pesquisadora, a nova variedade de grão contribuiria para elevar os ganhos dos agricultores, que passariam a ter um produto diferenciado nas mãos com grande aceitação no exterior. "É uma opção para o lavrador ganhar, não a indústria", afirma ela. Um grão naturalmente sem cafeína, por exemplo, poderia obter a certificação de orgânico. De acordo com dados internacionais, apenas 10% de todo café consumido no mundo (foram 40 milhões de sacas em 2010) é descafeinado. Embora não existam indicadores confiáveis sobre a tendência de consumo desse tipo de café, no Brasil ou no mundo, especialistas afirmam que os consumidores mais ávidos são os americanos e os europeus. No Brasil, o gosto pelo descafeinado ainda é restrito a muito poucos - menos de 1% dos consumidores. Para se chegar ao café descafeinado é necessário submeter os grãos a processos químicos - normalmente o solvente diclorometano -, o que o desqualifica para a certificação. No Brasil, a descafeinização é feita apenas por uma empresa, a Cocam Cia. de Café Solúvel e Derivados, na região de Catanduva (SP). Procurada, a empresa não quis conceder entrevista. Além de prestar o serviço à indústria de retirada da cafeína dos grãos, a Cocam vende esse subproduto a outros segmentos industriais. Por seu efeito estimulante, que age diretamente sobre o sistema nervoso central, a cafeína é utilizada em larga escala para a manipulação de refrigerantes e energéticos, fármacos (de analgésicos a inibidores de apetite) e cosméticos. Além da cafeína natural, a indústria se abastece também de cafeína sintética. Recursos – Bernadete Silvarolla enfatiza que a descoberta de cafeeiros descafeinados só foi possível graças à preservação do banco de germoplasmas (coleção de material vegetal vivo) no Instituto Agronômico de Campinas. “Embora sua importância não seja tão aparente, inclusive para a mídia, esse banco é a matéria-prima dos pesquisadores para o melhoramento de toda espécie vegetal, um material genético cuja preservação é fundamental”, pondera. A ênfase da pesquisadora se deveu à discussão sobre o impacto da descoberta de um café naturalmente descafeinado frente o produto industrializado e os geneticamente modificados. Luís Carlos Fazuoli afirma que o IAC não trabalha com transgênicos, ressalvando, porém, que não vê nenhuma situação de confronto. “Sou adepto do processo de melhoramento tradicional, mas acho que as duas linhas de pesquisa podem ser feitas concomitantemente. Temos o projeto do genoma do café, que vai nos trazer muitas informações relevantes. Existem mais de 80 espécies de café para serem estudadas”, informa. Ele sugere que a seqüência das pesquisas com as AC, que incluirão toda a avaliação bioquímica e molecular e ainda dependem de captação de recursos, poderia motivar um projeto temático para estudo de outros componentes importantes do lote da Etiópia. “Esperamos o reconhecimento da importância do produto que encontramos e um atendimento especial em termos de incentivo à pesquisa”, finaliza. Clique aqui e acesse o artigo da nature- Plant biochemistry: A naturally decaffeinated arabica coffeeFontes: www.cafepoint.com.br www.nature.com www.unicamp.br |
segunda-feira, 19 de março de 2012
Café Descafeinado Direto do Pé
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